sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Liberdade


Andei filosofando sobre antigas questões vendo um programa sobre “base jumpers”, aliás muito bem feito, sobre a jornada de  três  rapazes que planejaram e  fizeram um salto num lugar inóspito da China. Entre paisagens lindíssimas e relatos pessoais interessantes desses jumpers, percebe-se bem a relação deles com a questão da  liberdade. O quanto o desafio aos limites da gravidade é  encarado como condição dessas pessoas só se sentirem livres realmente ao encararem a morte nessa atividade tão perigosa.

 Percebo a questão da liberdade um pouco diferente, bem menos física. Sinto que a liberdade se relaciona com a coragem de enfrentar limitações e conquistar uma prontidão amadurecida para novas etapas e desafios. Paralelamente,  encaramos no dia-a-dia  a difícil disciplina de buscar uma vida interiorizada e harmonizada com nosso ser autêntico. Pensar fora do jugo da mídia é para poucos, liberdade também se encontra  em trabalharmos nosso pensamento para não ser carregado pela força da lavagem cerebral diária. O mercado se empenha demais em formatar as pessoas e direcionar suas vidas para o consumo orientado aos interesses de poucos.

Dentro da mesma ideia, sabemos que somos livres na mesma medida em que lidamos bem com as consequencias de nossas opções legítimas de vida e “pagamos” o preço de não estar atendendo às expectativas do senso comum. De qualquer forma há os que continuam a carregar os grilhões escolhidos por eles mesmos, só não fazem o que querem por não querer viver as consequências. Creio que a solução é achar o”caminho do meio”, onde se muda  gradativamente os aspectos de vida que são massacrantes até chegar a situação almejada.

As vezes radicalizar como os Jumpers pode modificar, de forma instantânea, um bloqueio ou uma atitude subserviente á vida. O importante é vislumbrarmos os vários Caminhos e não desistir da busca. Não há prêmio maior que uma vida plenamente vivida.


(Esse texto se refere ao documentário do canal OFF passado em 04/agosto/2014)

4 comentários:

Anônimo disse...

O Controle remoto deve ser, talvez, o máximo de liberdade que um cidadão “normal” consiga experimentar hoje.
Ali no mundo digital haverá sempre a possibilidade de mudar a realidade em um clique.
Claro, posso também fechar as cortinas e não enxergar que o meu semelhante recolhe sua
Vida na minha lixeira.
Cerca elétrica, grades, corro blindado, segurança na rua ... Não tem mais sessão das onze,
Vista chinesa, namorar no carro, voltar pra casa chutando lata ... Existencialismo, yoga, terapia e individualismo.
Liberdade é o nome que damos à nossa cegueira.
Perdoa, foi só um dia ruim, Não acontece sempre.
Saulo

Helena Erthal disse...

bom dia Saulo,

gostei muito de seu comentário. Muito lúcido. É verdade estamos vivendo desse jeito mesmo. infelizmente estamos acumulando muito mais que um dia ruim...
sei que não perderá sua poesia.
abraços
helena

Anônimo disse...

Difícil não perder... Há um quê de dúvida, distanciamento, e até mesmo de impaciência quanto ao momento presente. Quando você diz para não perder a poesia, ainda que num prisma figurativo, tomo a liberdade de dirigir sua observação àquilo que gostaria de dizer. Aí fica uma triste sensação de que estamos arrancando a palavra da pedra, à força. O grito que ecoa como resposta não é “como” e sim (por quê?) escrever. Fazemos isso pela necessidade de expurgar sentimentos, dores pungentes, forças incontroláveis. Mas escrevemos principalmente porque é da nossa natureza fazê-lo. Então, porque não queremos que nossos sentimentos, dúvidas e inquietude adormeçam esquecidos em algum canto da memória, nós os exteriorizamos. Ainda que pra isso seja preciso expor ao outro nossa fragilidade. Sofremos ainda o medo de abandonar sentimentos e ideias amarelando ao sabor dos anos, presas no labirinto de nossas lembranças, mas sempre pedindo, implorando para virem à luz. Então o fazemos. A tentativa de eternizar o momento presente, capturar/apreender um instante, como fotografia, por vezes nos obriga a infringir a barreira do razoável. Prendemos o momento no papel porque sabemos que o passado é inerte. Sabemos que nunca mais o veremos, nunca mais o mesmo cheiro, o mesmo gosto... Nem as cores serão as mesmas. Antes fosse apenas o laborioso ofício de garimpar palavras, arte dos poetas. Às vezes invejo seu otimismo com relação à vida, ao outro. A maneira elegante que você usa para horizontalizar temas por vezes polêmicos. Pode parecer difícil captar impressões sobre alguém quando a única coisa que você tem são umas poucas palavras. Mas a palavra, quando exposta, torna-se uma “assinatura” da alma. Ou, numa visão materialista, o texto me parece como um dna intelectual. Por isso entendo quando voce aponta a opção de escolher o caminho do meio. Mas me perdoa por achar que o caminho do meio também pode ser o meio do caminho. A metamorfose incompleta... Você já não é mais como antes e tem a dura certeza de que não há caminho de volta. Dentro de voce explode a esperança de vencer a outra metade e cumprir a sua jornada. Então, Helena, é aqui que nos encontramos, no meio do caminho. Mas eis que de repente a gente percebe que esse caminho não é uma reta, perfeita e iluminada. Mas um emaranhado de possibilidades e também da ausência de possibilidades. E não importa a escolha que voce faça, em algum momento da vida estaremos no meio do caminho. Pode acontecer na sua adolescência, um pouco mais adiante ou mesmo quando já não acreditávamos mais que pudesse acontecer. Em algum momento nos acharemos presos no meio do caminho. Liberdade absoluta só os inocentes as tem. Lia Luft disse uma vez que “a liberdade das crianças nos dá medo, por isso as queremos enquadrar”. Foi isso ou algo parecido, mas a essência é essa. Às vezes nos acorrentamos em conceitos como liberdade, certeza, verdade, futuro... Olha aí que presunção, futuro! Palavras tão carregadas de significante que às vezes deveriam ser proibidas, ou sei lá, ter uma licença pra usar. Algo assim como um porte de arma. Isso mesmo, um porte de palavras. É isso, boa Helena. Hora de parar porque como disse lá no início, escrever é se expor.
... um abraço!
Saulo

Helena Erthal disse...

Prezado Saulo,

Fico feliz em vê-lo expressar-se tão livremente...após, o que me pareceu, um longo período de asfixia...Sim, precisamos escrever, não vamos nos importar com o quanto expomos nossas almas pois o mais importante é a conexão que fazemos com o outro...seja ele(a) quem for.

Quando alguém faz um comentário lindo como esse que você me brindou, vale por todo silêncio que meus textos já receberam de meu ínfimo público. Ma é como você bem colocou, escrevemos porque é da nossa natureza, não para alguém ou por alguém.

Tento manter uma prontidão positiva ao por vir, manter minha alegria, como um guerreiro que se renova para combater a próxima batalha. Meu alimento vem das leituras/reflexões e da manutenção de minha saúde, que sem isso não existe como empreender nada.
Concordo contigo sobre a questão do “caminho do meio” que as vezes pode acabar sendo o meio do caminho. Mas creio que temos como perceber as questões que precisam ser tratadas de forma radical, e assim agirmos. É uma sintonia a ser conquistada, através dos nossos erros e acertos.
Nenhuma vida é para ser, ou pode ser linear e fácil de levar, senão o sentido maior se perderia, não é mesmo?
Agradeço pela reflexão e mais ainda pelo texto elegante e genuíno, sim, você assinou dessa vez.

abraços
helena